2 April 2021

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Minorias raciais da Ubisoft - Lauren Stone

Nota da edição: As minorias raciais estão drasticamente subrepresentadas em toda a indústria de videogame, incluindo na Ubisoft. De acordo com a [Pesquisa de Satisfação dos Desenvolvedores da IGDA (Associação Internacional dos Desenvolvedores de Jogos) de 2019] (https://s3-us-east-2.amazonaws.com/igda-website/wp-content/uploads/2020/01/29093706/IGDA-DSS-2019_Summary-Report_Nov-20-2019.pdf), apenas 19% dos desenvolvedores não se identificavam como pessoas "brancas/Caucasianas/Européias". Minorias raciais da Ubisoft é uma série que destaca as vozes e histórias de pessoas de grupos raciais minoritários da Ubisoft em um esforço para oferecer um exemplo à próxima geração de profissionais de jogos, além de tornar a indústria mais acolhedora e inclusiva. A série se desenvolverá em temporadas, cada uma com um tema diferente. A Segunda Temporada se concentrará em histórias de representação na mídia.

“Lau desliga.”

A última coisa que poderíamos gravar com a Melissa O'Neil, a atriz que dá voz à Faye Lau em Tom Clancy’s The Division, foi sua despedida. Por mais que essas palavras fossem o adeus de Faye à Divisão, elas também foram meu adeus. Como a Faye, eu não era mais "uma agente da Divisão".

Quando as pessoas imaginam autores de Tom Clancy, não acho que imaginam alguém como eu. Uma ex-atriz de teatro musical com excesso de peso, uma yonsei (descendente de quarta geração de japoneses) nipo-americana da Califórnia, que poderia muito bem se passar por uma pessoa branca, descendente de sobreviventes do campo de concentração japonês-americano e cuja tataravó "branca" paterna possuía uma loja de tamales (um tipo de pamonha da culinária mesoamericana) e uma pensão em Stockton, na Califórnia, na qual quem não conseguisse pagar o aluguel era posto por ela para trabalhar fazendo os tamales. Por mais impossíveis que fossem as condições, meus antepassados encontraram uma maneira de fazer dar certo.

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Voltei à escola em 2009 para aprender a escrever, porque ninguém estava escrevendo histórias para pessoas como eu; queria fazer o trabalho que ninguém estava fazendo. Quase 10 anos depois de me formar com um bacharelado em redação criativa, tive o privilégio de contar essas histórias e muitas outras. Por causa dos jogos, essas histórias chegam a milhões de pessoas todos os dias e podem mostrar aos jogadores que pessoas como eu são muito mais do que os estereótipos que nos foi permitido desempenhar. Que a única verdade sobre a humanidade é que ninguém nunca pensa que é o vilão.

Sempre acreditei que minha cultura era digna de inclusão, que as tradições e formas de arte com as quais cresci eram bonitas, válidas, complexas e dignas de admiração. Quando fui transferida para uma nova escola no ensino fundamental, me apresentei aos meus colegas fazendo uma mistura de dança contemporânea e dança nativa ao som de "Holiday", da Madonna, no show de talentos da escola, porque me ensinaram que a melhor maneira de participar de um intercâmbio cultural, e de trazer empatia e compreensão, era através da história e da arte.

Meu primeiro contrato com a Ubisoft durou oito semanas e foi para ajudar a escrever umas curtas linhas sistêmicas de Rainbow Six Siege. Seis meses depois, estava em um estúdio de gravação com a Angela Bassett. Quando terminamos a sessão, não consegui me conter e disse: "Podemos parar um segundo pra processar que acabamos de trabalhar com a incrível Angela Bassett, caralho?" Ela riu e me abraçou. Minhas apresentações nem sempre são "apropriadas", mas são autênticas. Essas memórias são surreais e sinto como se fossem da vida de outra pessoa. Esse é um objetivo de carreira, não o começo de uma carreira. Agora, seis anos depois, estou escrevendo isso de minha casa na Suécia, tendo entregado oficialmente seis títulos para a Ubisoft, uma expansão, e quase 20 DLCs.

Mas escrever para Rainbow Six Siege não foi nada comparado a escrever a Faye Lau ou a Alani Kelso; essas são as minhas garotas. Eu não criei nenhuma dessas mulheres. São personagens que herdei. Quando comecei a trabalhar com as dubladoras Melissa O'Neil e Sonya Balmores, nas sessões de gravação, percebi que elas tinham mais a oferecer do que o que tínhamos dado. Essas personagens são muito mais do que só "fodonas". Nunca são retratadas como estrangeiras; ninguém nunca pergunta pra elas: "Mas de onde você é de verdade?" Elas amam suas famílias e comunidades e fariam qualquer coisa para protegê-las, mas têm personalidades muito diferentes. Escrever para essas duas personagens asiático-americanas foi mais surreal do que receber um abraço de Angela Bassett.

Todos, para o bem ou para o mal, são os heróis de suas próprias histórias, e se eu conseguir fazer com que 10% de nossos personagens fictícios pareçam menos com Aaron Keener (embora eu ame escrever o Aaron Keener e trabalhar com seu dublador, John Hopkins) e mais como Kelso ou Theo Parnell (o nerd das tecnologias negro que trabalha com Keener em The Division 2: Warlords of New York Expansion), sei que estou no lugar certo para mudar quem consideramos digno de ser incluído e considerado um herói.

Eu não sou nenhuma heroína. E minha carreira não faz nenhum sentido. Nunca me considerei uma jogadora; não era uma cultura que eu me sentia confortável em reivindicar, porque não cresci com consoles. Eu fazia apostas, jogava cartas; montava quebra-cabeças, jogava jogos de tabuleiro e era viciada em arcades. Por muito tempo, os quebra-cabeças foram minha terapia. Eles realmente ajudam com minha ansiedade quando me sinto fora de controle e não consigo resolver problemas grandes. Resolver os pequenos me faz sentir com que seja possível vencer. Costumo dizer às pessoas que meu trabalho é ser uma mestra mundial de quebra-cabeças lógicos.

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Particularmente, eu adoro o caos de resolver um quebra-cabeça sob pressão, seja um projeto de jogo ou na hora de fazer um jantar. Quando você tem que se adaptar, encontra uma maneira de fazer dar certo. Nada jamais será perfeito, mas vai ser feito. Esperar a perfeição é cansativo. Esperar a perfeição é abusivo. Esperar a perfeição é ficar à beira de um penhasco mental. Essas são lições que aprendi ao longo da minha carreira e não sinto a necessidade de jogar um quebra-cabeça de celular faz dois anos.

Quando tudo o que você quer fazer é ajudar as pessoas a melhorar seu trabalho, as pessoas pedem sua ajuda. O ex-Diretor Criativo de Rainbow Six Siege, Xavier Marquis, me deu os melhores conselhos antes de eu ser transferida para The Division: "Não tem a ver com o projeto, tem a ver com a equipe." Ele está certíssimo. Você pode ter a melhor IP do mundo, mas sem uma equipe saudável, a experiência pode ser horrível.

Quando cheguei em The Division, o jogo principal já tinha sido entregue. Fui trazida para o conteúdo da DLC e para trabalhar na sequência. Quando começamos a escrever roteiros, escrevi alguns para a Faye e me disseram: "Você não pode escrever para a Faye. A Melissa está reservada um programa de TV, não está disponível."

Quando falamos em fazer a Expansão Warlords of New York (WONY), a primeira coisa que eu disse à produção foi: "certifiquem-se de que podemos conseguir a Melissa, isto não vai funcionar com uma dublê de voz."

Por sorte, "The Rookie", a série em que a Melissa é atriz regular, nos deixou tê-la... quando ela não estava filmando. Nossas sessões com a Melissa foram nos fins de semana e começaram às 18 horas (horário da Europa Central) no mínimo, e como você pode imaginar, a diferença de horário entre a Califórnia e a Suécia dificultou um pouco a programação.

Na primeira sessão que tive com a Melissa para o WONY, ela estava se ajeitando na cabine e conversando com o engenheiro em Los Angeles. Não tínhamos sido apresentadas, mas eu conseguia ouvir sua voz. Ela estava animada e nervosa. A primeira coisa que ela disse que me marcou como algo que eu precisava lembrar foi: "Obrigada por me chamar de novo, pensei que todos me odiavam."

Eu disse a ela que ela não deveria acreditar em tudo que lê no Reddit; que ser a pessoa que diz a quem joga o que deve fazer é o trabalho mais ingrato nos jogos, e é raro que não sejam pessoas odiadas.

Ela riu.

Quando fui escrever os dois últimos monólogos que Melissa iria apresentar como Faye, eles eram para a mulher que riu. A mulher que estava fazendo uma carreira para si, bem sucedida, muito ocupada e que precisava de advogados para ajustar seu contrato no programa para poder trabalhar conosco. A mulher que não queria ser substituída. Melissa queria fazer isso, então sua equipe fez com que se tornasse realidade.

De jeito nenhum estaríamos gravando com ela às 9h (horário do Pacífico) de um domingo de manhã se ela não quisesse estar lá.

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Eu queria que as pessoas vissem a Melissa. Simpática. Legal. Engraçada e inteligente. ALERTA DE SPOILER: PLOT DE THE DIVISION 2 Eu queria que as pessoas que odiavam a Faye porque ela era sua supervisora, a "superpolicial" que perdeu um olho e foi forçada a ser posta de lado, cuja irmã foi assassinada, que te traiu e se uniu ao Black Tusk, entrassem em conflito consigo quando a matassem. E se não tivessem entrado em conflito antes da luta, queria que entrassem quando ouvissem as mensagens que ela deixou para Rhodes e Benitez.

Eu queria que nossos jogadores a vissem como uma pessoa real, por mais mal orientada e errada, que ela tivesse uma certa razão. Ela fez o que achava necessário; não queria enganá-los, mas sabia que eles ou não entenderiam porque ela iria trabalhar com o Black Tusk, o PMC global que quem joga tinha passado as últimas cem horas enfrentando; ou tentariam dissuadi-la.

Esses monólogos são dirigidos a outros personagens em the Division, mas eles são realmente para quem joga e para a minha equipe. Para quem odeia a Faye e para quem a ama, e para a minha equipe porque eu os estava deixando. Queria que eles soubessem que, embora eu não estivesse mais tecnicamente na equipe deles, fiz uma escolha que esperava que pudesse continuar ajudando-os.

O arco da Faye, do Brooklyn ao End of Watch, é o tipo de história que raramente se foca em uma mulher de cor. É ainda mais raro que a personagem seja uma mulher asiática, a atriz é uma mulher asiática, a pessoa que escreve os roteiros é uma mulher asiática, e todos nós crescemos na América do Norte, portanto ninguém tem "um sotaque." Que a comunidade sendo representada é criada por essa comunidade.

Representatividade nos meios de comunicação importa, sim. É preciso ser respeitoso e que haja intenção para que tenha sentido. A diversidade não pode ser o traço principal do caráter; o foco tem que ser a humanidade. A humanidade é universal.

O lado bom e o ruim da boa representatividade é que você se vê. Se você quiser ressignificar The Division como algo que promove os piores valores de nossa sociedade, é possível, o jogo faz isso. Mas à medida que você explora e descobre os registros de áudio, as reconstruções do ECHO e as outras histórias das pessoas daquele mundo, você começa a questionar se a narrativa é ou não crítica a esses valores. As pessoas não são só boas ou más. As pessoas são grupos complexos de neuroses e o que você vê como mal, pode ser um mecanismo de sobrevivência em uma sociedade doente.

Nós herdamos a dor, a alegria, a doença e a cultura. E, às vezes, herdamos personagens que nos permitem compartilhar nossa humanidade com o mundo para criar empatia, compreensão e conexão.

“Lauren desliga.”

Não deixe de conferir todas as histórias das Minorias raciais da Ubisoft.

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